terça-feira, 30 de março de 2010

LINHA DO TEMPO


Ellery, o Bairro que Vi Crescer
João Bráulio do Nascimento, ex-morador do bairro Ellery.
A década de sessenta foi uma das mais prodigiosas sob os aspectos político, econômico e cultural. Aquela época, embora não compreendêssemos bem esta questão, o mundo estava dividido entre as ideologias do capitalismo e do comunismo, comandadas, respectivamente, pelos EUA e pela Ex-URSS. Essa luta travada entre as duas potências se exteriorizou pela Guerra do Vietnã e pela corrida espacial, vencida pelos americanos com a chegada do primeiro homem (Neil Armstrong) a lua, em 21 de julho de 1969. O Brasil, aliado ao sistema capitalista, passou de 1964 a um sistema ditatorial com o cerceamento dos direitos individuais e coletivos, num período negro que durou cerca de vinte anos.
Na música, os Beatles eram os reis do rock. No cinema as estrelas mais famosas eram Brigitte Bardot, Jane Fonda e Sophia Loren. Entre os atores despontavam Charlton Heston, Marlon Brando, Alan Delon e Charles Bronson.
O Movimento feminista começou a dar seus primeiros passos em busca de mais liberdade sexual com o uso da pílula, a questionar o casamento como um dogma imposto pela Igreja e pelo Estado, a usar biquini nas praias e vestir mini-saia. A luta pelos mesmos direitos estava deflagrada e os homens que se cuidassem. Hoje, só nos resta dizer: Elas venceram!
Na mesma época, no Brasil, surgiu o movimento da Jovem-Guarda, encabeçado pelos cantores Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléia, Renato e seus Blue Caps, os Golden Boys, Ronnie Von, Jerry Adriane, Wenderley Cardoso, Martinha, Nara Leão e outros. Tal movimento criou os nossos ídolos e ditava o ritmo das músicas que tocavam nos bailes de formaturas e tertúlias, no rádio se ouvia as radionovelas, como: O direito de nascer, Meu Pé de laranja lima, Jerônimo, o Herói do sertão e outras.
Roberto Carlos em sucesso da época cantava: "Quero que você: me aquela neste inverno e que tudo mais vá pro inferno...". Enquanto isso, Wanderley Cardoso era o Bom Rapaz e Rossini Pinto traduzia as músicas dos Beatles e fazia as versões para Renato e seus Blue Caps. Será que a pirataria já vem desse tempo?
No futebol, vimos o Brasil ser tricampeão mundial no México, em 1970, sem compreender e pouco fazer frente à situação que o nosso país enfrentava à época com o regime ditatorial, exceção feita ao movimento estudantil e às pessoas que estiveram diretamente envolvidas na luta armada contra o regime. Não tínhamos a tecnologia, o progresso e a ciência como os conhecimentos de hoje, entretanto, usufruíamos da liberdade plena de ir e vir, pois saíamos das festas e/ou tertúlias tarde da noite sem nos preocuparmos com questão de segurança, já que Fortaleza era uma cidade pacata.
Os espaços eram muitos, sobretudo para jogar futebol. Entre os bairros Alagadiço, Presidente Kennedy, Monte Castelo e Carlito Pamplona situava-se a Vila Ellery e Santa Maria, hoje conhecido como Bairro Ellery, havia também o açúde João Lopes, onde tomávamos banho sem nenhuma poluição, dividindo os quatro bairros e, nas imeidações existiam cerca de 5 (cinco) campos de futebol. Aos domingos era nosso divertimento assistir aos jogos do Flamenguinho de seu Fernando, do Tabajara de seu Lino, do Vila Iracema do Biril, do Humaitá do Paraibano (hoje Cezar e Dona Zezinha), do Alagoas do Raimundo Delfino e seu Eduardo (hoje do Dedim) vi nascer os times Cruzeiro do Júlio, o BD esporte do Toin bebe leite, o Vai quem quer do Raimundinho da Picanha, o JK do Querido, o Joinville do seu Geraldo e dona Socorro, o Guarani da dona Gracinha, o velho Ceará, o Coca-Cola do Zé Maria, o liberal do seu Raimundo, o Grêmio do William da dona Zezinha, enfim bons times do subúrbio.
Não existia computador pessoal, celular, CD, DVD, nenhuma dessas parafernálias que atualmente fascinam os jovens, nem existia também esse consumismo exagerado. Em compensação tínhamos espaço para jogar futebol, soltar pipa, trocar figurinhas de álbuns, jogo de bila, de bafo, brincar de mãos ao alto, imitando os filmes de bang-bang (Faroeste). A propósito, entre os Gibis da época, comprávamos e permutávamos entre os colegas as revistas mais famosas como Flexa-Ligeira, Fantasma, Tio Patinhas, Mickey e Pateta, Zé Carioca, Zorro, Superman, Batman, Kit Casson e Búfalo Bill.

Televisão existia (a primeira da dona Consuelo), porém era artigo de luxo, de forma que as pessoas de bom coração, que possuíam aparelho de TV, enchiam suas salas de estar com crianças para assistir aos seriados. Era o Televizinho, uma das formas mais solidárias que existia de se fazer amizade entre as crianças e famílias. A TV só funcionava à noite e ficávamos contando as horas para assistir aos seriados. Chegávamos ao delírio ao ver o Zorro desenhar com a espada o "Z" na barriga do Sargento Garcia. O seriado Bonanza era outro de nossa preferência, com a saga da família cartwright. Exemplo de bravura, honradez e coragem em defesa de seu rancho em Cartwright, um homem de propósitos, e seus três filhos (Joe, Ross e Adan), deram exemplo de bravura, honradez e coragem em defesa de seu rancho em Nevada, no Velho Oeste Americano. Este seriado era espetacular não só pelas histórias, mas também pela música de introdução, bem como por ver o mapa de Nevada queimando e aparecendo, logo em seguida, os quatro personagens. Os vários filmes da época como Rin Tin Tin, Tarzan, Perdidos no Espaço, Túnel do Tempo, O Homem de Virginia, Jeanny é um gênio, a Feiticeira, Daniel Bone, Durango Kid, Chaparral e outros.
Entre essas pessoas citamos a família do Sr. Walter Marinho e Dona Adail (seus filhos Walter Filho, Cláudio. Oscar e Alan), a família do Sr. Pedro Paulo (Seu Pedro) e Dona Senhorinha na rua Gilberto Câmara, o Senhor Manoel Simpes e Dona Joanilza que moravam vizinhos aos Grupo Escolar Honôrio Bezerra. O Sr. Cruz, dono da madeireira do bairro (Presidente do Conselho do Bairro). O Sr. Leônidas dono do depósito de construções, Sr. Simãozinho dono de mercearia, O Sr. José da Costa dono da empresa de ônibus de uma só porta com trocador cobrando passagem com dinheiro exposto entre os dedos e seus motoristas como: Capote, Pichilinga, Geraldo e Chico, o mais antigo. A mercearia do pai dos pobres no final da linha. O Sr. Francisco (Chico) e seus filhos Lusimar e Valdeni do referido Grupo Escolar, tinham a tarefa de todos os dias ligar e desligar o Televisor Público, a fim de que as famílias e crianças humildes pudessem assistir programas preferidos.
Aos domingos pela manhã, assistia aos jogos de sinuca na mercearia de seu Zezinho e se deliciar com doce de leite, depois dos jogos nas noites de domingo ia para missa no bairro Carlito Pamplona porque no Bairro ElIery não existia igreja, depois da missa saiamos para as tertúlias no CREVE (Clube Recreativo da Vila Ellery) do Sr. Venêncio e dona Stela, ou então nas residÊncias dos amigos, a base de luz negra, as famosas discotecas ao som de Tina Charles, Elvis, Beatles e tantos outros.

No grupo escolar Honôrio Bezerra, onde estudei, lembro-me que existia só alfabetização, primeiro ano fraco, primeiro ano forte, segundo ano e terceiro ano e só estudavam homens. lembro-me de meus amigos de dasse: Evaldo, Roberto Moreira, do Pedra, do Jorge, do Etiseu e outros... Das minhas professoras: luzanira, Terezinha, das Diretoras dona Fransquinha e de dona Eleomar. Não se pode esquecer, também, do Prof. Firmino e seu irmão Toinho, os quais como pessoas de bem davam o bom exemplo como educadores dirigindo uma Escola que era referência no Bairro Ellery.
Foi nesse cenário que vimos o Bairro Ellery crescer, numa Fortaleza simples, acolhedora, segura e solidária, onde as pessoas tinham o prazer de dividir com seus amigos, vizinhos e familiares o pouco que tinham. Não possuíamos riqueza sob o ponto de vista econômico ou financeiro, mas éramos ricos e felizes porque tínhamos espaço, segurança, liberdade e fraternidade, coisa que não encontramos neste mundo globalizado de hoje.
O Sr. Manoel do Nascimento, homem respeitado e conhecido no Bairro Ellery, tendo inclusive assumido a direção do Conselho do Bairro (Presidente) e devido a sua excelente atuação, conseguiu o saneamento do açude João Lopes e ainda hoje reside no Bairro.

Um comentário:

  1. Bela matéria!
    Viajei no tempo e me vi assistindo tv no Grupo Escolar Honório Bezerra, onde estudei pouco tempo cursando o primeiro ano.
    Lembrei do motorista Capote com seu rosto pintado que dirijia um ônibus da linha Vila Ellery, o qual diferentemente do motorista era totalmente prata, da cor do alumínio.

    Lembrei do campo do Vila Ellery onde jogavam os irmãos Arlís, Haroldo e Ives.
    Estudei na escola do seu Arlís e depois no colégio do seu Firmino.
    Mudei de bairro em 1970, porém até hoje lembro com saudade dos tempos de infância vividos no Bairro Ellery.
    Os anos de 1967, 1968 e 1969 jamais serão esquecidos.

    Fco. Souza

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