terça-feira, 30 de março de 2010

POESIA DO BAIRRO ELLERY


Eu te saúdo bairro dos meus encantos
De simplicidade e autonomia;
Aqui meio desconfiado cheguei,
Estudando as pessoas,
Observando as ruas,
Tomando nota dos acontecimentos,
Gente da gente foi a conclusão.
Rasos passos dados
Pelas ruas de graça e simbolismo
Percebi a localização privilegiada
Tudo parece cativar quem arrisca o bairro;
Aqui por sobre o canal
Deixo o rastro sob a temperatura de 30, 40;
O vento vem logo a seguir
E à sombra de figos e benjamins
Vivo o silencio nada mutante desta terra.
Se aqui vim parar
Compartilho do que é óbvio,
Coligo com gente simples,
Desfrutando de amizades
Com a profusão de um estadista.
Estamos a quatro quilômetros do centro
Próximo também da modernidade
E vivendo bem quem bem quer viver
A paz de um bairro simples.
Nos arrabaldes da comunidade ellerense
Co-irmãos tradicionais se arrastam,
Mas nosso bairro progride,
Se liberta do anonimato
E a alcunha de vila se escapa.
Desconversando ou discutindo
Me misturo com gente de toda fé,
Freqüento os bares de nossa gente
E paro para lançar palavras
Sobre assunto meio complexo.
Quando necessário se faz expor defesa
E também seus critérios,
Para unir-me em torno dos valores
Não esqueço dos amigos,
Muito menos dos familiares
E, claro, do bairro que me acolheu,
Então lutar sem rebeldia pelos direitos
Já que os deveres se concretizam;
O povo não se acha só protegido
Mas consciente de que é um por todos
E todos por um, sempre...
Tobias Marques Sampaio
Poeta e escritor

FINAL DOS ANOS 40


O loteamento Parque Themóteo dá origem as duas principais ruas da então Vila Ellery: as ruas Major Veríssimo e Gilberto Câmara. Nas proximidades da Av. Sargento Hermínio, na época apenas uma vereda que ligava os bairros Monte Castelo, Cachoeirinha e Monte Picu, hoje Presidente Kennedy, passando nas Quatro Bocas, hoje Olavo Bilac, as famílias começavam a fixar residência, aí também havia a Hospedaria Getúlio Vargas, construída para atender aos retirantes que chegavam do interior do estado fugindo da seca, mas acabou servindo mesmo para alojar os desabrigados das cheias da época.
O açude João Lopes era represado na, hoje, Av. Sargento Hermínio nas terras de Odete Pacheco, próximo ao forno crematório (hoje garagem da Expresso Guanabara), onde se colocava o lixo coletado em Fortaleza, um açude que transbordava alagando os bairros Monte Castelo, Floresta, Brasil Oiticica (parte do Jacarecanga) e adjacências. Nesta década, e em outras depois, o açude serviu de lazer para as pessoas da região, para banhos, pescaria em anzol e landuá, e para as lavagens de roupa realizadas pelas “lavadeiras das cacimbas do João Lopes”, que deixavam as roupas estendidas às margens do açude, sem preocupação de que fossem roubadas, a água do açude era límpida servindo para o consumo das pessoas.
As ruas do bairro, hoje asfaltadas, eram veredas, muitas em meio ao mato, numa paisagem com muitos cajueiros, azeitoneiras e pitombeiras. Nesta época as terras da região estavam nas mãos de poucos proprietários: no sentido oeste para leste havia primeiro as terras da família Ellery, que deram nome à “vila” anterior ao bairro, e ao próprio bairro, seguidas pelas terras de Odete Pacheco, e pelas terras de Juvenal de Carvalho, proprietário da Maternidade Juvenal de Carvalho, próximo à av. Bezerra de Menezes.

1946 - O açude João Lopes arromba, levando prejuízo aos moradores da região. Notícia do jornal O POVO de 3 de maio de 1948 dizia que na Vila Santa Maria (próximo ao bairro Monte Castelo) ‘‘nada menos que 200 casas foram inundadas entrando pelos quintais e saindo pela porta da rua a água levada de roldão, encaixerando galinhas, gatos, cachorros, porcos e outros animais domésticos.’’. Isto numa manhã em que Fortaleza amanheceu inundada: “Famílias inteiras’’ saíam de casa procurando lugares mais elevados. ‘‘Grupos de pessoas com enxadas, latas, vasilhames, pás, etc., a abrirem regos para dar vazão a água.’’.
1949 - 200 soldados do Exército foram acionados nos primeiros socorros das vítimas das inundações provocadas pelo açude João Lopes, ''talvez tenha sido a maior chuva caída em Fortaleza nos últimos dez anos'', anunciava O POVO em 6 de maio de 1949 sobre a tempestade iniciada na noite anterior. Foi chamada de minidilúvio. Da rua Governador Sampaio à Prainha do Arraial Moura Brasil, passando pela Barra do Ceará, Pici, Parque Bela Vista e São João Tauape, ''as águas invadiram tudo''. Na tragédia, ruas alagadas, casas em ruínas e centenas de famílias desabrigadas. Abrigadas, aliás, pela hospedaria Getúlio Vargas - por ironia, um lugar mantido pelo Estado para acolher os que fugiam da seca.

''As ruas centrais não escaparam, todas elas, principalmente a Major Facundo eram vertiginosas correntezas (...). (No parque das Crianças), grupos de moças e rapazes, tripulando duas canoas, remavam por entre os bancos e canteiros dos jardins''.
O jornal apresentava dois índices pluviométricos diferentes para aquela data. Ainda na manchete, a informação: ''até as 10 horas de hoje choveu em Fortaleza 270 mm''. O que se igualaria ao volume da chamada ''chuva do século'', no ano de 1997. No texto, outro dado é divulgado: ''Segundo o Pluviômetro do Serviço de Meteorologia choveu 250 mm''.

DÉCADA DE 50


Os terrenos próximos ao açude João Lopes começam a ser loteados, havia muitas cercas para que não ocupassem as terras sem comprá-las, sendo que os compradores com maior condição financeira compravam os terrenos mais elevados, para tentar escapar dos problemas trazidos pelo transbordamento do açude. Aos ocupantes mais pobres ocorria, inclusive, a discriminação dos moradores da região da REFFESA, chamando os que moravam muito próximo do açude de “bichos-de-pé”, os mais abastados proibindo até os filhos de jogarem futebol com aqueles. A energia elétrica para esta região vinha da Brasil Oiticica em postes de madeira, uma das poucas empresas da região na época, que beneficiava a oiticica em óleo, sendo que era um serviço muito deficiente, uma luz muito fraca, mais parecida com o luzir de lamparinas.
Para o lazer havia muitos campos de futebol, como o Campo do Iracema e do JK, próximos onde hoje estão a rua Raquel Holanda e o Pólo de Lazer Alagadiço, e o Campo do Cruzeiro ao lado de onde hoje está a Praça Manoel Dias Macedo; as casas de jogos da família Paixão (dona também de hortas pelo bairro), o Forró do Humaitá, que ficava onde hoje está o Conjunto Habitacional Cidade Alta, as afamadas tertúlias, as quermesses, que eram festas dançantes, com barracas, onde as músicas eram tocadas nas radiadoras, havia a disputa dos partidos azul e vermelho e os carnavais, onde as pessoas usavam qualquer roupa e arremessavam maisena umas nas outras.
Naquela época a rua Safira era chamada de “Piçarra”, por causa do material avermelhado de que era composta, lá passavam ônibus com uma certa cobertura de lona. As moças tinham medo dos “rabos-de-burro”, estupradores que ficavam à espreita, sendo recomendado andar acompanhada de pai, irmão ou marido. As pessoas iam às missas no Instituto das Irmãs, no bairro São Gerardo, e na Igreja N.ª Sr.ª do Perpétuo Socorro, no bairro Carlito Pamplona. As compras eram feitas na “feira de segunda-feira”, no lugar onde hoje está o Mercado do Carlito Pamplona, não havia mercados no bairro Ellery, apenas pequenas mercearias, então lá se abastecia de tudo.
No final dos anos 50, o Estado do Ceará sofreu uma das maiores secas até então registradas, o que acarretou a ocupação mais intensa de favelas como: Pirambú, Lagamar e Verdes Mares.

DÉCADA DE 60


Para resolver o problema da luz elétrica ineficiente os moradores negociam com a CONEFOR, responsável pelo abastecimento de energia elétrica no início da década de 60, melhores instalações para os que moravam as beiras do açude João Lopes, o que incluiu postes de cimento e transformadores, isto em 1962. No serviço de educação havia a Escola Estadual Honório Bezerra, fundada em 1964, chamada na época de “Grupo” Honório Bezerra, era a escola mais procurada na época, com o que hoje corresponde ao ensino fundamental, na época ensino primário – próximo a esta escola foi instalado o Chafariz, uma das primeiras obras de interesse público do bairro, servindo ao abastecimento de água potável aos moradores, também havia a “Escola do Seu Firmino”, escola particular que funcionava na esquina da rua Major Veríssimo com avenida Tenente Lisboa, e a escola que funcionava no Instituto das Irmãs.
Por volta de 1969, o lazer diário era a ida das famílias assistir a TV pública, em preto-e-branco, que ficava ao lado do Grupo Escolar Honório Bezerra, iam assistir novelas e programas como a “Família Trapo”. Havia o forró no CREVE (Clube Recreativo e Esportivo Vila Ellery) e ainda os muitos campos de futebol, que aumentavam em número, pois o açude ia secando e as pessoas construíam campos.
1962 - No dia primeiro de janeiro os moradores do Pirambu realizaram uma marcha até o Centro de Fortaleza, com a participação de mais de 30 mil pessoas, no sentido de evitar a desapropriação da área que vinha sendo ameaçada com várias tentativas de expulsão dos moradores.

DÉCADA DE 70


Os governantes da época, com a corriqueira situação de transbordamento do açude João Lopes e alagamento da região que o rodeava, no caso o bairro Ellery, a realizar a canalização e conseqüente desobstrução do açude, os trabalhos começaram em 1972 e foram concluídos dois anos depois. O serviço de saúde pública era inexistente no bairro, mas havia as parteiras-enfermeiras, formadas na experiência e na necessidade da comunidade, como no caso da D. Maria de Jesus, conhecida carinhosamente como “Mãe de Jesus”, que morava por trás do “Grupo” Honório Bezerra. Havia também as rezadeiras que realizavam um importante trabalho de informação sobre prevenção de doenças e mortalidade infantil, mas nos casos graves, com grande dificuldade, deviam se locomover aos jardins do Teatro José de Alencar, onde funcionava a SANDU, uma espécie de pronto-socorro da época.
Sobre a segurança pública havia construção das sub-delegacias, isto por volta de 68-70, sob o comando do General Manuel Cordeiro Neto, espécie de secretário de segurança pública da época, possuía o apelido de “lata furada”, pois sua política era de colocar aqueles que cometiam pequenos delitos, como embriaguez e desordem, para ajudar na construção dos prédios das sub-delegacias, à moda da época, de terno de linho e gravata, os homens carregavam latas furadas cheias de barro no ombro, saindo imundos da labuta.
Em 1974 é fundada a Escola Professor Martinz de Aguiar, primeiro com tele-ensino, e depois, com ensino de 1ª a 8ª séries, e em 1976 foi inaugurado o Centro Interescolar de 1º Grau Dona Creusa do Carmo Rocha, para atender aos alunos de 5ª a 8ª séries com seus diferentes cursos profissionalizantes. Havia trabalho na Brasil Oiticica (fábrica de castanha), Mecesa (metalúrgica) e Thomás Pompeu (tecelagem).
Na primeira chuva da década de 70, em 21 de janeiro, o jornal O POVO registrou 116 telefones ficaram paralisados, pane no fornecimento de energia e a denúncia da precariedade do sistema de esgotos. ‘‘Toda vez que chove, a história já saturada se repete’’, avaliava o jornal em 11 de junho de 1973. E conclui: ‘‘Sem a mínima infra-estrutura para enfrentar aguaceiros (...) a Capital cearense fica prisioneira das águas’’. Famílias desabrigadas e inundações nas margens dos leitos de rios e riachos foram conseqüências da ‘‘maior chuva do século XX’’, em 3 de junho de 1977. Mas a precipitação de ‘‘quase’’ 200 mm não seria realmente a maior do século, apesar de ter causado estragos comparados aos de um ‘‘minidilúvio’’.
No fim dos anos 70, a FASE (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional) começa sua atuação nos movimentos de bairros.

DÉCADA DE 80


Nesta época os membros do Conselho do Bairro lutam por duas conquistas: a construção de uma paróquia para o bairro e a construção de uma associação do bairro, para organizar e mobilizar para novas conquistas de melhorias para a comunidade. Inicia-se também a luta por terra e moradia no bairro, através de diversas ocupações organizadas, que viria a ser a principal marca da luta social local.
1982 - É criada a Federação de Entidades de Bairros e Favelas de Fortaleza (FBFF).
1984 - Primeira ocupação de terra do bairro.
1985 - Maria Luíza Fontenele (PT) é a primeira prefeita após o longo de governos militares ditatoriais no país, onde foram extintas as eleições diretas para cargos políticos públicos. Esta gestão foi sensível a questão de luta por moradia na comunidade.
1986 - Fundação da Associação Comunitária do Bairro Ellery. Ocorre a ocupação do terreno próximo ao açude João Lopes por 500 famílias.
1987 - Programa do leite do governo do presidente José Sarney fica a cargo, no bairro, da ACBE. Reivindicação para a construção do posto de saúde. Manifestação de panelas vazias por emprego e renda.
1988 - A luta nacional pela Assembléia Nacional Constituinte, para a criação de uma nova constituição para um país que deixava de ser governado por ditadores militares.
1989 - A invasão de terra para a construção de creche.

DÉCADA DE 90 E INÍCIO DO SÉCULO XXI


A ocupação desordenada de Fortaleza ganha velocidade na década de 90. O processo de favelização se agrava e, conseqüentemente, os problemas em áreas ribeirinhas, que passam a ser habitadas, transformando-se em áreas de risco, nisto se percebe que a questão da falta de acesso à terra e moradia aflige a maioria da população da capital, sendo que a onda de ocupações de terra no bairro Ellery prossegue nesta década, sendo que esta luta organizada rendeu ao bairro o status de bairro que mais conquistou conjuntos habitacionais no estado.
Na década, um marco: a chuva de 270 milímetros, em 24 de abril DE 1997, considerada a maior do século XX. Com ela, desabrigo e desespero, previsíveis. Quatro dias depois, o balanço: 2.675 desabrigados, nove ruas e avenidas precisando ser restauradas, 35 bairros com problemas de desabamentos, alagamentos e erosão. ‘Cresce em 67% ocupantes de áreas de risco (em um ano), informava O POVO em 1º de fevereiro de 1998 sobre o levantamento da Defesa Civil do Estado. Em 1998: 9.556 famílias e 47.800 pessoas atingidas pelas chuvas.
O açude João Lopes , agora um canal, mais parece uma fossa a céu aberto, dada a poluição do local, pois muitos moradores jogam dejetos no canal desde algumas décadas antes. Os que moram próximo do canal reclamam do mau cheiro e das muriçocas que invadem as casas.
O divertimento conta com o Pólo de Lazer Alagadiço, que fica na Av. Sargento Hermínio, com o futebol na areia, a pista de skate, a pista de bicicross improvisada e a “feira dos bichos” aos domingos. Durante a semana, há caminhadas e muitos casais de namorados que se aventuram num perigoso passeio noturno. Outro lugar muito movimentado é a Praça Manoel Dias Macedo, conhecida por “pracinha” ou “praça da Igreja”, onde ficam a paróquia do bairro e a Associação Comunitária do Bairro Ellery. As pessoas não vão à festas em clubes no bairro, eles não existem mais, agora vão à festas em casas de show espalhadas pela cidade.
Muitas entidades e associações surgem, como: Associação Com. Vida Nova do B. Ellery, Associação Cristã do B. Ellery, Associação de Moradores do B. Ellery e Monte Castelo, Associação Habitacional dos Moradores do Conjunto Vila Ellery, Sociedade Habitacional Vila Ellery, entre outras. No campo religioso não há apenas religiosos católicos, há evangélicos, espíritas, etc.
1990 - Implantação da Creche Favo de Mel na ACBE.
1992 - Criação do Posto de Saúde Dr. Paulo de Melo Machado.
1993 - Ocupação de terra no Monte Castelo e início da construção do 1º mutirão no bairro Ellery para 35 famílias. Desenvolvimento da Rádio Mandacaru FM, importante pela realização e luta por uma comunicação para a sociedade, feita pelos meios de comunicação, mais democrática e descentralizada, não apenas feitas por um pequeno grupo de grandes empresas de telecomunicação que visam apenas a audiência e criação de lucro, promovendo uma desqualificada comunicação para as massas, rádio onde os protagonistas eram operários, jovens, mulheres, todos convertendo-se em comunicadores populares e dos populares, pois a integração rádio/comunidade é um dos principais objetivos.
1994 - Ocorre nas ruas do bairro Ellery o 2º Grito dos Excluídos, evento anual e nacional, promovido pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e diversos movimentos sociais, que coloca em questão a necessidade de sociedades menos desiguais e mais fraternas, colocando no centro da discussão a auto-organização dos mais desamparados socialmente por esses objetivos.
1995 - A construção de casas em regime de mutirão no Monte Castelo. Início da construção de casas em regime de mutirão no Padre Andrade. Feirinha cultural aos sábados na Praça da Igreja.
1997 - Construção de casas em regime de mutirão no Curió. Grandes cheias do açude João Lopes, a população vai as ruas em protesto por melhor moradia e saneamento básico.
2005 - Realização do 1º Encontro Social do Bairro Ellery, com a participação de diversas organizações populares (comunitárias, culturais, de segmentos, ONGs, etc.) e instituições educacionais e religiosas.
2006 - Criação do sítio eletrônico do Bairro Ellery, nas comemorações dos 50 anos do bairro.
2008 - Bairro Ellery ganha o prêmio Gentileza Urbana com o projeto Arte na Mureta realização da artista plástica Liliana Uchoa, em parceria com a Associação Comunitária do Bairro Ellery. No bairro é realizado o Curso de Criação de Sites para Bairros em Software Livre, iniciativa da equipe do sítio do Bairro Ellery, afim de expandir os conhecimentos adquiridos com o site. O curso é ministrado por Daniel Almeida Chagas.
2009 - Realizado o 1º Festival de Marchinhas Lauro Maia, uma iniciativa da associação do bairro.